Wednesday, July 13, 2011

MAIS UMA EXCLAMAÇÃO RARA PRA CACILDA




Nos últimos meses, por uma coincidência dessas que se programadas não dariam certo, vários amigos e amigas minhas de áreas diversas vêm mencionando a saudosa atriz Cacilda Becker (1921/1969) em diversos contextos: suas peças, comerciais para televisão, ligação com o Teatro Oficina e até citação em discurso de Caetano Veloso. Pois aqui vai minha contribuição, e à minha moda: um disco onde ela e Walmor Chagas, seu marido e parceiro, interpretam canções da peça Isso Devia Ser Proibido, encenada em 1967, com texto de Walmor com Bráulio Pedroso e música de Julio Medaglia (pois é, por falar em Caetano, quem gosta de pesquisar deverá gostar de saber que o arranjo de "Tropicália" não foi a única coisa que Medaglia fez naquele ano). Aqui vão a gravação e os selos do disco, um compacto duplo (onde a RGE aparece apenas como estúdio independente, não gravadora); este meu exemplar (que nem capa tem) é o único que vi até hoje.



http://www.4shared.com/get/A1tW3EJJ/cacilda_becker_e_walmor_chagas.html

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Sunday, July 10, 2011

FELIZ MEIO ANO NOVO

Parafraseando Rod McKuen (e tudo bem se você conhece via Frank Sinatra), foi um meio-ano muito bom. Como compositor, em seis meses comecei e/ou lancei mais que isso de parcerias novas (a saber: Akane Keiko, Léo Nogueira, Lúcia Helena Corrêa, Márcio Policastro, Sérgio Veleiro, Socorro Lira e Sonya Prazeres); muitas já podem ser ouvida no Clube Caiubi de Compositores, em minha página ou de alguns dos parceiros citados.

Este primeiro semestre de 2011 teve mais. Saiu o documentário A História Do Rock Em Sorocaba, dirigido por Cleiner Micceno e de que participei (já que contribuí para o rock da cidade enquanto morei lá, desde que comecei a tocar em 1971 - 40 anos, o tempo passa - até voltar a Sampa em 1979). Formei o grupo Liga Leve, dedicado a MPB com toque de jazz, ao lado de Thelma Chan, o saxofonista Nestico Aguiar e a mana pianista Lilu Aguiar. Comecei a trabalhar como assessor de imprensa do selo independente Sonarts. E minha pesquisa sobre música e circo - a de maior porte já realizada em todo o mundo - , feita por encomenda do Centro de Memória do Circo, foi colocada à disposição do público no próprio CMC, na Galeria Olido, em Sampa. Achaste pouco? Lancei meu primeiro videoclipe, "O Torpedo", caseiro mas funcional.

E meu próximo disco, que eu havia anunciado como Os Microssambas para abril, foi adiado e deu lugar a outro projeto, Lados-E, de canções que tenho lançado primeiramente por meios eletrônicos como blogs, emissoras virtuais de rádio e TV e listas de discussão (daí o título do disco); este deve sair em setembro - desta vez sai mesmo, pois quase todo o material já está gravado, rerre. Há ainda outros projetos que estou encaminhando e negociando. De modo que este segundo semestre de 2011 promete ser ainda melhor...

BLUES, AMOR, POESIA, CHARME... C'EST LA VIE

Tudo na vida é troca e negociação, ciclos e reciclagem. O jornalista, compositor, tradutor, músico, escritor, pesquisador de música popular e blogueiro acaba de deixar por algum tempo de ser também participante em feiras de colecionadores de discos. Mas redescobriu que, além de letrista, é também poeta. E, a convite da amiga e afetuosamente quase-conterrânea Carmen La Vie (de Sorocaba, onde morei durante a adolescência e portanto é também terra do meu sertão), acabo de ter a honra de estrear como poeta em Blues, Amor E Poesia, blog produzido por ela. Corram até lá (ou podem ir devagarinho, hoje é domingo) para ver, não só meu poema, mas o blog inteiro: http://www.bluesamorepoesia.blogspot.com/

Monday, July 04, 2011

SEGUNDO GRANDE FESTIVAL DE MANOLITA

Em 2006 me pediram uma pesquisa sobre a canção "Manolita" de Leo Daniderff e resolvi compartilhar o resultado aqui no blog. Três anos depois, a pedido do Centro de Memória do Circo, fiz uma pesquisa sobre música e circo - que acabou se revelando a primeira de grande porte em todo o mundo - e descobri que "Manolita" tem tudo a ver com circo, visto que fez sucesso por ser cantada nos picadeiros, começando pelo palhaço-cantor Eduardo das Neves, autor da versão em português mais conhecida. Dessa pesquisa resultou uma nova leva de Manolitas.

Vicente Celestino, nosso emérito tenor punk, mestre brasileiro do dramalhão musical, também gravou "Manolita" em 1943, mas fez sua própria versão em português. E o sucesso de "Manolita" não passou despercebido pelo bom humor. A valsa teve pelo menos duas paródias lançadas em disco, por Alvarenga e Ranchinho e Zé Fidélis - sim, ambas lançadas em 1943, mas quinze anos depois Zé Fidélis gravou nova versão revisada em seu primeiro LP, Zé Fidélis E Suas Paródias (também o primeiro LP brasileiro de humor!). 


Sobre a gravação de Alvarenga e Ranchinho, recomendo ler este  texto.

E a gravação mais recente que conheço de "Manolita" é de um LP de 1969, no estilo "pilantragem", com uma Bandinha Pilantra menos misteriosa que as cantoras francesas de 1910/11, pois inclui o maestro Ivan Paulo e, no coral, Edgard Gianullo e Noriel Vilela, além de aludir aos Velhinhos Transviados (e à "Ventania" de Geraldo Vandré!) no título do disco, Macropíla - De Como Uns Velhinhos Perderam O Cavalo E Passaram A Andar De Fusca.

Todas as gravações citadas de "Manolita" podem ser conferidas aqui.

Para terminar (enquanto não aparecerem novas ou velhas gravações de "Manolita", é claro), direi que, ao menos para mim, a melodia do refrão ("alza, alza, Manolita...") me lembra a de "La Violetera" ("Llevelo usted señorito...") de José Padilla, outra canção sobre a qual me solicitaram pesquisa e que merece mais "festivais" destes; aqui está o primeiro.

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Friday, July 01, 2011

ASSEVERANDO A CANÇÃO PORTUGUESA

Poucos pretextos para falar de algo são melhores do que efemérides, e de repente percebi um assunto tão interessante para mim quanto cheio delas: a saga de Severa, a quase lendária fadista portuguesa e, ao que consta, criadora do fado moderno, que certamente exerce influência sobre Amália Rodrigues, Eugénia Melo e Castro, Dulce Pontes ou qualquer outra grande cantora portuguesa desde então. A Severa, peça do escritor português Júlio Dantas (1876/1962) baseada na vida de Maria Severa, estreou há 110 anos, em 25 de janeiro de 1901 (e fez tanto sucesso que Dantas adaptou a peça para um romance no mesmo ano). A Severa, primeiro filme sonoro português, estreou há 80 anos, em 18 de junho de 1931. E há 20 anos (mais exatamente, em dezembro de 1990) as gravações deste filme foram reeditadas pela primeira vez em LP, graças a Deus e ao selo brasileiro Evocação, fruto da iniciativa do colecionador Paulo Iabutti; vejam acima (clicando em cima com o ratão) uma resenha do disco que escrevi para a saudosa Folha da Tarde em 7 de janeiro de 1991. (Severa foi Maria Severa Onofriana, 1820/1846 – sim, ela faleceu quase aos míticos 27 anos de Robert Johnson, Noel, Hendrix, Cobain, Winehouse e outros que nasceram para queimar a vela pelas duas pontas e brilhar muito.)

O LP A Severa é discoteca básica para quem gosta de música dos anos 1930 para trás em geral e música portuguesa em particular. Quase todas as canções – fados em vários andamentos, viras, valsas e até pasodobles – fizeram grande sucesso e se tornaram clássicos da canção lusitana. Muitas receberam adaptações populares e até comerciais. Por exemplo, o corrido “Arraial De Santo António” foi usado em comerciais da caninha Tatuzinho e do Banco Português do Brasil (“são 50 anos de atividade/é a Caravela da Tranquilidade”), e “Solidó [sim, a palavra vem das notas musicais “sol-e-dó”] Dos Bolieiros” foi adaptada pelos músicos circenses Maurício Schumann, pai e filho, para encerrar as funções do Circo Nerino: “Está tudo acabado/Está tudo terminado/Os artistas estão cansados/Vão dormir/Amanhã tem outra vez/Se os senhores querem voltar/Seu Nerino fica contente/Em ver grande enchente...” (Seu Nerino era Nerino Avanzi, o palhaço Picolino, e também diretor do Circo Nerino. [2]) A marchinha “História do Brasil” de Lamartine Babo, sucesso de 1934, testemunha o grande sucesso do filme A Severa no Brasil: “Pra cá tudo mudou/Passou-se o tempo da vovó/Quem manda é a Severa/E o cavalo Mossoró” [3]. E li num blog português não assinado sobre um jingle de sucesso no rádio local: “A Severa era uma louca/E para lhe adoçar a boca/O Conde, que era o António Luiz Lopes,/Comprava-lhe Drops.”

Exemplares originais de discos 78 RPM da trilha do filme A Severa (eu possuo um) são mais fáceis de encontrar que filmes ou peças fiéis a obras ou fatos em que se baseiam; no caso d’A Severa, nem mesmo o romance foi fiel à peça, quanto mais o filme – e poucos filmes tomaram tantas liberdades com o assunto quanto este. “A Severa não é uma obra histórica, é um filme de sugestão tradicional”, resumiu o diretor do filme, Leitão de Barros. Para começar, o próprio Dantas, autor dos diálogos e consultor do roteiro, mudou a profissão original de Maria Severa de prostituta para "conhecida cigana" (assim diz o cartaz promocional do filme). E podemos escolher: Severa na peça original morre de um ataque cardíaco e ainda consegue se despedir cantando um fado (“eu quero morrer cantando/já que cantando nasci”); no romance ela sucumbe após violenta discussão com a mãe; e no filme seu fim é mais romântico, de ataque cardíaco nos braços de seu amante, o famoso Conde de Marialva. Achaste poucas estas mudanças? Pois bem: recente filme sobre determinado político brasileiro o mostrou como grande bebedor de cerveja e não cachaça como na realidade (mudança devida, segundo consta, a esse filme ser patrocinado por uma cervejaria), e o roteiro de A Severa, feito pelo próprio Dantas, foi mais além: Severa aparece na peça e no filme como amante do Conde de Marialva, mas na vida real seu amásio nobre foi outro conde, Dom Francisco de Paula Portugal e Castro, Conde de Vimioso (1817/1865). Seus descendentes, ao saberem de que Dantas estava para levar a vida de Severa aos palcos, pediram a ele – por intermédio de ninguém menos que o Rei de Portugal! – que poupasse a família Vimioso da exposição pública do Conde como a pessoa folgazã e irresponsável que foi (ter sido amante de uma rameira foi o de menos). E Dantas acedeu, substituindo o Conde de Vimioso por Dom Pedro José Vito de Menezes Coutinho, o último Conde de Marialva, falecido em 1823. Sim, Maria Severa tinha apenas três anos de idade e portanto não poderia ter sido amante de Conde algum, mas esse detalhe só interessa a pesquisadores dinossauros e chatos como eu...

Aqui vai um bom fac-símile de uma edição de 1931 da peça A Severa. E confiram o texto do romance, numa digitação recente.


E o filme foi lançado em VHS em 1992 e já se tornou novamente raro, mas pode ser visto no Youtube.

(O filme A Severa fez sucesso em vários países, até na Rússia, certamente por suas muitas qualidades como cinema, não pela capacidade de Dantas em fazer como o governo soviético e reescrever à vontade a História. Ah, sim: o atestado de óbito da verdadeira Severa dá a causa de sua morte como “congestão cerebral”.)

Dina Thereza (1902/1984), atriz e cantora que se celebrizou no papel principal do filme, e que começou a carreira usando seu verdadeiro nome, Dina Moreira, veio ao Brasil por ocasião do lançamento do filme, e gostou tanto do país que aqui se radicou. Aqui estão duas notícias sobre ela na Folha de S. Paulo, uma de 24 de outubro de 1933 sobre uma apresentação na cidade de Santos e outra de 10 de outubro de 1967 sobre sua carreira (por algum motivo, esta reportagem de 1967 está disponível no acervo digitalizado da Folha na internet com trechos ilegíveis, ao contrário da cópia xerox que recebi junto com o LP e que aqui reproduzo).


Tinhorão me disse que achava as canções d’A Severa “bonitinhas” e que muito provavelmente foram adaptadas do folclore português. Bem, isso é verdade pelo menos no “Velho Fado da Severa”, do qual há uma gravação anterior ao filme, com título “Fado Que Cantava A Severa”, sem indicação de autoria, interpretada pela cantora Medina (sobre quem nada descobri até o momento) e lançada em algum ponto de 1907 a 1912. Pois é, o maestro e compositor Frederico de Freitas (1902/1980), autor da trilha do filme e creditado como autor desta e outras canções nele interpretadas, não poderia ter composto esta mais do que Severa poderia ter sido amante do Conde de Marialva...

O LP A Severa é um belo exemplo de trabalho de amor, até na sequência de suas 12 faixas, a qual resolvi manter neste "relançamentozinho" virtual com algumas faixas bônus, inclusive gravações da trilha do filme, com a própria Dina Thereza se acompanhando à guitarra portuguesa (se bem que em cinema nunca se sabe, ou ela toca bem ou dubla muito bem, mas competente em qualquer dos casos). Perdoem a qualidade sonora, embora as gravações sejam dos anos 1930 e até antes.

1 - Orquestra regida por José M. Lucchesi – A Severa (Seleção) (Frederico de Freitas) (Victor 34976-A)
2 - Dina Thereza - Vira (Frederico de Freitas - Julio Dantas) (Victor 34975-B)
3 – Orquestra Parisiense regida por Frederico de Freitas - Valsa do Filme A Severa (Frederico de Freitas) (Victor 33028-A)
4 - Silvestre Alegrim - Solidó Dos Bolieiros (Frederico de Freitas - Julio Dantas) (Victor 34977-A)
5 - Dina Thereza - Velho Fado Da Severa (Frederico de Freitas - Julio Dantas) (Victor 34978-A)
6 - Dina Thereza - Novo Fado Da Severa (Frederico de Freitas - Julio Dantas) (Victor 34978-B)
7 - Orquestra regida por José M. Lucchesi – A Severa (Marchas Da Tourada) - pasodoble (Frederico de Freitas) (Victor, 34976-B)
8 – Maria Sampaio - Arraial De Santo António (Frederico de Freitas - Julio Dantas) (Victor 34977-B)
9 - Dina Thereza - Na Taberna/Fado Da Espera De Toiros (Frederico de Freitas - Julio Dantas) (Victor 34973-A)
10 – António Fagim com coro - Canção Do Romão (Frederico de Freitas - Julio Dantas) (Victor 33028-B)
11 - Maria Isabel - Canção Da Chica (Frederico de Freitas - Julio Dantas) (Victor 34978-B)
12 - Dina Thereza - Canção Da Severa (da revista Ai-Ló) (António Melo - Frederico de Freitas) (Victor 34973-B)
13 - Dina Thereza - Feira d'Alcântara (fado-canção da revista Ai-Ló) (António Melo - Frederico de Freitas) (Victor 34901-B)
14 - Dina Thereza - O Garoto (Victor 34901-A)
15 - Frederico de Freitas - Hino Da Carta (da trilha do filme)
16 - Dina Thereza - Velho Fado Da Severa - versão do filme (Frederico de Freitas - Julio Dantas)
17 - Dina Thereza - Novo Fado Da Severa - versão do filme (Frederico de Freitas - Julio Dantas)
18 - Frederico de Freitas - Valsa do Filme A Severa - versão do filme (Frederico de Freitas)
19 - Frederico de Freitas - Novo Fado Da Severa – segunda versão do filme (Frederico de Freitas - Julio Dantas)
20 - Silvestre Alegrim - Fado Do Timpanas (Solidó Dos Bolieiros) - versão do filme (Frederico de Freitas - Julio Dantas)
21 - Dina Thereza - Canção Da Chica (versão do filme) (Frederico de Freitas - Julio Dantas)
22 - Medina - Fado Que Cantava A Severa (sem autoria) (Victor Record 98621, gravação mecânica, um só lado)

E informática serve para isso: leia muito mais sobre o assunto num blogue português intitulado justamente O Blogue Da Severa.

[1] Sim, pasodobles, influência inescapável e benéfica - ao contrário da tourada, claro - da vizinha Espanha, exatamente como guarânia paraguaia no Brasil e nosso tanguinho ajudando na formação do tango argentino; temos também violino cigano e influência das “jazz-bands” estadunidenses - atenção para o banjo em algumas faixas.

[2] Peguei esta informação do belo livro Circo Nerino escrito por Roger Avanzi (o palhaço Picolino 2, filho de Nerino Avanzi) e Verônica Tamaoki; lá falta apenas o título da canção d'A Severa.

[3] Mossoró, outro destaque na letra desta marchinha, foi um dos primeiros cavalos campeões do turfe brasileiro.

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