ROCKY SPLENDOUR SHOW: LEMBRANDO ROCKY SHAHAN
Há alguns dias
fui encontrado por um compacto de um certo Rocky Shahan, sem outro crédito
(produção, arranjo, gravadora original) além da data e autoria. Eu não me
lembrava desse nome e na hora imaginei que poderia ser um brasileiro se passando
por estrangeiro ou, pelo nome, um imitador do cantor Ricky Shayne, aquele do
megahit “Mamy Blue”, num caso similar ao de Trini Lopez/Prini Lorez ou do
estrangeiro Gary Miles/Garry Mills. Buscas no Google em dias diferentes me ligaram
esse artista a quatro outros assuntos: psicodelismo britânico, pop europeu, nossos
Festivais Internacionais da Canção e David Bowie.
Rocky Shahne tem uma pequena mas
interessante bagagem como compositor, cantor, produtor, guitarrista e
contrabaixista. Ele conseguiu um bom nome no Brasil participando do FIC,
representando seu nativo Paquistão com “The Best Man” em 1970 e “Love Is
On My Mind”, alcançando o segundo lugar, em 1971. Shahne foi elogiado pela
crítica, como atestam os recortes abaixo (e a revista Manchete louvou-o como “o
estrangeiro que mais entende de música brasileira”). Shahne agradou também como
pessoa, inclusive conversando em português com algumas damas de biquíni. No FIC
de 1971 ele foi acompanhado por um ainda desconhecido e promissor Guilherme
Lamounier ao piano. E as canções citadas podem ser ouvidas aqui clicando-se nos títulos, “Love Is On My Mind” e "The Best Man” (o arranjo desta inclui o que me soa como uma cuíca - e logo veremos que a influência brasileira na música de Shahne não parou aí!). Esta última saiu no LP brasileiro do Festival, mas curiosamente “Love Is On
My Mind” permaneceu e permanece, até onde pude saber, inédita em disco. Confiram este recorte da revista Billboard de 30 de outubro de 1971.
E esta notícia saiu no jornal O Estado De São Paulo do dia 3 do mesmo mês:
E leiam mais sobre Rocky Shahan no FIC aqui, aqui e também aqui.
O estilo de
Rocky Shahne é interessante, e acho que posso defini-lo como uma fusão de
Richie Havens com as baladonas de Elton John de 1969-1971 mais o charme e exotismo
não-anglófonos de, por exemplo, Demis Roussos. Além das duas canções acima, ele
gravou pelo menos mais dois compactos, um deles – vejam só – aparentemente
lançado apenas no Brasil! Ambos merecem um parágrafo cada um.
Um destes
compactos traz “Vibeke” acoplado com "Cherry Tree”, e pode ser ouvido no Youtube clicando-se
nos títulos. (Para evitar que pessoas que não saibam o que
significa “Vibeke” passem noites sem dormir, trata-se de um nome de mulher de
origem dinamarquesa.)
O outro é o que me encontrou recentemente e a que me referi lá em cima,
“I Am Watching You Leave”/”Let Us Sing Together” lançado no Brasil em 1971 –
detalhe: o lado-B é um samba! Obviamente, é um dos resultados do esforço
conjunto da organização do FIC e da gravadora Polydor de conseguir gravações
abrasileiradas de aristas estrangeiros – foi assim que o “cantautore” francês Antoine
gravou sua “Le Match De Football” como “Jogo De Futebol”, Françoise Hardy entoou em português seu hit “Bown, Bown, Bown” e Jimmy Cliff cometeu uma versão
pilantragem da valsinha “Serenô”. Digitalizei este compacto brasileiro de Rocky
Shahne, que pode ser ouvido aqui.
Não, não me esqueci de lembrar o
que Rocky Shahne tem a ver com David Bowie. Shahne foi contrabaixista dos
Konrads, a primeira banda de que participou o jovem saxofonista e “crooner” que
ainda atendia por David Jones (e às vezes por “David Jay”), Pelo que pude
entender do que li sobre os Konrads até agora, Bowie entrou no grupo em 1962,
um pouco antes de Shahne, e este saiu ou juntamente com Bowie, em 1963, ou um
pouco depois. Em 1964 e 1965 os Konrads lançaram dois compactos hoje raros e
obscuros, ambos já sem Bowie e provavelmente também sem Shahne, “I Thought Of
You Last Night” e “Baby, It’s Too Late Now”. Os Konrads fizeram algumas
gravações demo incluindo Bowie e Shahan, mas não parecem estar entre outras
demos do grupo que recentemente apareceram na internet, e uma gravação demo dos
Konrads realmente incluindo Bowie (“I Never Dreamed”) tem sido apenas comentada
mas não divulgada; a busca dos primeiros sons do Camaleão ao sair do ovo
continua. (Leia aqui mais algo sobre os Konrads.)
Mas é facto que Shahan (assinando-se “Rocky Shan”) e outro ex-Konrad,
o guitarrista Neville Willis, formaram o grupo Pregnant Insomnia, que gravou um
compacto em 1967, “Wallpaper”/”You Intrigue Me”, pela CBS inglesa – gravadora
da qual Rocky Shahan chegou a ser produtor; trabalhos seus na casa que descobri
até agora são um LP e alguns compactos da banda psicodélcia Andwella’s Dream, como
“Shades Of Grey” (não confundir com “Shades Of Gray” dos Monkees). Temos aqui mais informações sobre Shahan nesta fase.
E sobre o próprio Rocky Shahne, ele
participou de outros festivais internacionais, mas após 1973 ele desaparece, e
até pode posso ver ainda continua,desaparecido. No mais, consegui descobrir até
agora que ele nasceu no Paquistão em 1944 com o nome Rocky Chaudhari
(grafado por algumas pessoas anglófonas como Chowdhury), E os quatro assuntos
para pesquisa que citei no começo podem virar cinco, incluindo cinema e
televisão: o nome artístico Rocky Shahan é o mesmo de um famoso ator estadunidense
(Robert Ray Shahan, 1919/1981), de filmes como Flechas De Sangue e da série de
TV Rawhide – terá o cantor adotado esse nome em homenagem a ele?